Exigência de CPF no Imposto de Renda faz 1,2 milhão de dependentes ‘desaparecer’

Exigência de CPF no Imposto de Renda faz 1,2 milhão de dependentes ‘desaparecer’Em apenas um ano, entre 2017 e 2018, cerca de 1,2 milhão de crianças e adolescentes desapareceram das declarações de IR (Imposto de Renda) captadas pela Receita Federal.

Levantamento feito pelo Fisco e obtido pela Folha mostra que o “sumiço” dos jovens coincide com um aumento nas exigências feitas pela Receita com o objetivo de tornar o processo mais rígido e inibir fraudes.

A inclusão de pessoas que dependem financeiramente do contribuinte na declaração anual de renda gera benefícios ao pagador de impostos.

No cálculo do ajuste anual do IR, quando a pessoa fica sabendo se tem direito a uma restituição de imposto ou se deverá pagar, pode ser deduzido um valor fixo de R$ 2.275,08 por dependente. Também são permitidas deduções adicionais de despesas médicas e de educação desses jovens.

Em 2018, essa exigência foi ampliada, passando a ser obrigatório o preenchimento do número do documento para os maiores de 8 anos.

Após a implementação da mudança, o total de dependentes declarados no país caiu de 25,5 milhões para 24,3 milhões, o que representa uma redução de quase 5%.

A maior parte dos jovens que deixaram de aparecer nos registros, quase 900 mil, estava exatamente na faixa entre 8 e 12 anos de idade, que passou a exigir os dados do CPF.

De acordo com o supervisor nacional do Imposto de Renda na Receita Federal, Joaquim Adir, a inclusão de dependentes de forma incorreta não significa que eventuais tentativas de fraude foram bem-sucedidas.

Segundo ele, a maior parte das informações erradas cai na malha fina e os contribuintes acabam retificando as declarações.

“O contribuinte que faz isso sabe do risco”, disse. “Claro que passa um ou outro, mas ao longo dos anos, a Receita segura o contribuinte na malha até ele ajustar. No final, [o impacto] acaba não sendo grande porque a Receita corre atrás, faz cruzamentos.”

A Receita não apresentou estimativa de perdas de arrecadação.

O supervisor explica que as pessoas que seguem com informações irregulares são informadas pela Receita, recebem notificação de cobrança e podem ir para a dívida ativa da União. Ele pondera que dificilmente essas situações chegam à esfera criminal.

“Nesses casos, normalmente se considera um erro. Fica difícil provar que tenha dolo, que tenha intenção e seja um crime”, afirmou.

Na avaliação do advogado tributarista e professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Linneu de Albuquerque Mello, o desaparecimento em número elevado de dependentes na faixa que passou a ter cobrança de CPF indica tentativa de fraude.

“As pessoas vinham colocando a existência de um menor dependente, e o Fisco não tinha muito como verificar”, disse.

Mello ressalta que a digitalização e modernização dos sistemas da Receita vêm tornando cada vez mais difícil a atuação de fraudadores.

Segundo ele, as novas exigências e o cruzamento de dados reduz as tentativas de inclusão de dependentes que não existem ou de despesas médicas irregulares.

De acordo com o tributarista, a linha de estudos chamada de psicologia do contribuinte pode ajudar a explicar as tentativas de burlar o sistema. A oferta de serviços de baixa qualidade pelo governo poderia estar entre os fatores.

“Quando você vê o retorno do que você está pagando, você paga o imposto com maior satisfação. A partir do momento em que o contribuinte paga um imposto e não vê nada em troca, a tentativa de não pagar é enorme”, afirmou.

Nas declarações feitas em 2019, o governo já passou a exigir a inclusão do CPF dos dependentes de todas as idades.

Para Adir, a obrigação reduz os riscos de fraude e facilita o trabalho da Receita. Segundo ele, o Fisco espera que haja uma estabilidade no número de dependentes neste ano em relação a 2018.

Atualmente, é possível declarar como dependente o cônjuge ou o companheiro com que o contribuinte tenha filho ou viva há mais de cinco anos.

No caso de filhos e enteados, são elegíveis aqueles com até 21 anos, ou até 24 anos se estiverem cursando ensino superior ou técnico, ou a qualquer idade se forem incapacitados física ou mentalmente para o trabalho.

Podem ser incluídos irmãos, netos ou bisnetos de quem o contribuinte tenha guarda judicial, respeitando as mesmas regras de idade.

Há também previsão para menor pobre de até 21 anos que seja criado e educado pelo contribuinte, bem como pessoa considerada incapaz, da qual ele seja tutor.

Fonte: Folha de São Paulo

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